Cantiga de amor:
Senhora
minha, desde que vos vi,
lutei
para ocultar esta paixão
que me
tomou o coração;
mas não o posso mais e decidi
mas não o posso mais e decidi
que
saibam todos o meu grande amor,
a
tristeza que tenho, a imensa dor
que sofro
desde o dia em que vos vi.
Quando souberem que por vós sofri
Quando souberem que por vós sofri
tamanha
pena, pesa-me, senhora,
que por
vossa crueza padeci,
eu que
sempre vos quis mais que ninguém,
e nunca
me quisestes fazer bem,
nem ao
menos saber o que eu sofri.
E quando
eu vir, senhora, que o pesar
que me causais
me vai levar a morte,
direi,
chorando minha triste sorte:
“Senhor,
por que me vão assim matar?”
E, vendo-me tão triste e sem prazer,
E, vendo-me tão triste e sem prazer,
todos,
senhora, irão compreender
que só de
vós me vem este pesar.
Já que assim é, eu venho vós rogar
Já que assim é, eu venho vós rogar
que queiras
pelo menos consentir
que passe
a minha vida a vos servir,
e que
possa dizer em meu cantar
que está
mulher, que em seu poder me tem,
sois vós,
senhora minha, vós, meu bem;
graça
maior não ousarei rogar.
(Afonso
Fernandes)
As
cantigas de amor têm como principal característica o eu lírico masculino que se
encontra sofrendo por uma amada inalcançável ao seu ver. A amada é tratada como
senhora, ou até mesmo senhor, para passar a ideia de que quem escreve a cantiga
é submisso a ela.
Na
cantiga acima, de Afonso Fernandes, é possível ver claramente tais
características. Desde a primeira estrofe o eu lírico deixa transparecer seu
sofrimento por um amor não correspondido;
“ [...] que saibam todos o meu grande amor,
a tristeza que tenho, a imensa dor
que sofro desde o dia em que vos vi. “
É
possível perceber também que a voz masculina passa a imagem de sua amada como
uma mulher que não sabe ou se importa com seus sentimentos, tais que matam o
amante aos poucos. Sabendo disso o eu lírico, na última estrofe faz um pedido
que reforça a ideia de submissão à senhora pedindo para que ele possa ser capaz
de passar a vida a servi-la, pois, tal ato seria como uma graça em sua vida.
Partindo
agora para a estrutura é clara a precisão do trovador ao escrever, sempre se
preocupando com a ordem das rimas, por exemplo.
Senhora
minha, desde que vos vi, (1)
lutei
para ocultar esta paixão (2)
que me
tomou o coração; (2)
mas não o posso mais e decidi (1)
mas não o posso mais e decidi (1)
que
saibam todos o meu grande amor, (3)
a
tristeza que tenho, a imensa dor (3)
que sofro
desde o dia em que vos vi. (1)
Quando souberem que por vós sofri (1)
Quando souberem que por vós sofri (1)
tamanha
pena, pesa-me, senhora,
que por
vossa crueza padeci, (1)
eu que
sempre vos quis mais que ninguém, (4)
e nunca
me quisestes fazer bem, (4)
nem ao
menos saber o que eu sofri.(1)
Cantiga de amigo:
Ondas do mar de Vigo,
se vistes meu amigo!
E ai Deus, se verrá cedo!
Ondas do mar levado,
se vistes meu amado!
E ai Deus, se verrá cedo!
Se vistes meu amigo,
o por que eu sospiro!
E ai Deus, se verrá cedo!
Se vistes meu amado,
por que hei gran cuidado!
E ai Deus, se verrá cedo!
(Martim Codax. In Massaud Moisés. A literatura portuguesa através dos textos. São Paulo, Cultrix, 1998)
se vistes meu amigo!
E ai Deus, se verrá cedo!
Ondas do mar levado,
se vistes meu amado!
E ai Deus, se verrá cedo!
Se vistes meu amigo,
o por que eu sospiro!
E ai Deus, se verrá cedo!
Se vistes meu amado,
por que hei gran cuidado!
E ai Deus, se verrá cedo!
(Martim Codax. In Massaud Moisés. A literatura portuguesa através dos textos. São Paulo, Cultrix, 1998)
Enquanto na cantiga de amor percebemos
o eu lírico masculino, nas cantigas de amigo vemos um eu lírico feminino que
dirige o seu poema à um amigo que, embora seja amado, não é visto como superior.
Quem escreve, na maioria das vezes se encontra admirando ou esperando o amado,
como acontece no poema citado.
A estrutura de uma cantiga de amigo é
mais simples e apresenta paralelismo e uma repetitividade para a fácil
memorização.
Ondas do mar de Vigo,
se vistes meu amigo!
E ai Deus, se verrá cedo!
Ondas do mar levado,
se vistes meu amado!
E ai Deus, se verrá cedo!
se vistes meu amigo!
E ai Deus, se verrá cedo!
Ondas do mar levado,
se vistes meu amado!
E ai Deus, se verrá cedo!
(Martim Codax)
Cantigas
de Escárnio:
Quando você for se
embora,
moça branca como a neve,
me leve.
Se acaso você não possa
me carregar pela mão,
menina branca de neve,
me leve no coração.
Se no coração não possa
por acaso me levar,
moça de sonho e de neve,
me leve no seu lembrar.
E se aí também não possa
por tanta coisa que leve
já viva em seu pensamento,
menina branca de neve,
me leve no esquecimento.
moça branca como a neve,
me leve.
Se acaso você não possa
me carregar pela mão,
menina branca de neve,
me leve no coração.
Se no coração não possa
por acaso me levar,
moça de sonho e de neve,
me leve no seu lembrar.
E se aí também não possa
por tanta coisa que leve
já viva em seu pensamento,
menina branca de neve,
me leve no esquecimento.
(Ferreira Gullar)
Maldizer:
Roi queimado morreu con amor
Em seus cantares por Sancta Maria
por ua dona que gran bem queria
e por se meter por mais trovador
porque lhela non quis [o] benfazer
fez-sel en seus cantares morrer
mas ressurgiu depois ao tercer dia!…
Em seus cantares por Sancta Maria
por ua dona que gran bem queria
e por se meter por mais trovador
porque lhela non quis [o] benfazer
fez-sel en seus cantares morrer
mas ressurgiu depois ao tercer dia!…
(Pero Garcia)
Embora não sejam citados
separadamente na maioria das vezes, estes dois tipos de cantigas apresentam
diferenças. Em ambos os tipos ocorre uma crítica, mas nas de escárnio o autor
faz isso indiretamente e por meio de palavras com duplo sentido, enquanto nas
cantigas de maldizer o eu lírico não se preocupa em esconder suas críticas de
alguma maneira
Referências:
BERARDINELLI , In. FERNANDES, Afonso. Cantigas de trovadores medievais em português moderno.
In: GULLAR, Ferreira. Cantiga para não morrer. Online. Disponível em: <https://pensador.uol.com.br/frase/NjQwMjI/> . 25 set. 2016.
SOUSA, Pedro. Pero Garcia Burgalês . Online. Disponível
em: <http://cantigas.fcsh.unl.pt/cantiga.asp?cdcant=1411&pv=sim >.Acesso:
25 set. 2016.
As
cantigas de amigo. Online . Disponível em: <http://www.colegioweb.com.br/trovadorismo/as-cantigas-de-amigo.html>.
Acesso: 25 set. 2016.
Imagens:
Cantigas
de Santa Maria. Online. Disponível em: <http://lirakorbowa.pl/news/warsztaty/0
2016>. Acesso em: 25 set. 2016.
Cantigas
de Santa Maria. Online. Disponível em: <http://identidade85.blogspot.com.br/2015/02/cantigas-medievais-aifremosinha-se-bem.html
>. Acesso: 25 set. 2016.